Sou tão sórdido,
tão mórbido,
talvez senha sido por isso
que aquela cachorra tenha me mordido
Ando tão arrependido
ando tão perdido
e me perder é a minha maior virtude
sou um ser que se ilude
e não tem quem mude
essa minha maneira de ser
Sou este ser
Que vive do auto engano
que passa pano para a dor
que entra pelo cano
e está encanado,
encafifado igual um vampiro,
em noite de lampirídeo
uma nuvem no vídeo
um ser do suicídio
Eu sou este ser
Eu acho a morte ingrata
bato pino,
bato o sino do destino,
saio a cata
bato lata
e a morte não me mata
a morte me desmata
e fica essa coisa chata
no meu umbigo, ambígua
aqui ou no Taguá
em Angical ou em Belém do Pará
Eu nunca estou bem
nem comigo e nem com ninguém.
Sou este ser confuso, obtuso, intruso.
Tenho um parafuso a menos
um fuso horário
que me faz perder o itinerário
embora eu escreva
por ser o poema um ato libertário
Sou um homem-problema
e quem se identificar com o meu poema,
pode me ligar a qualquer hora.
Sou este ser que sonha
que mistura mamona com amônia
que não tem cerimônia
não tem vergonha
embora eu seja um homem triste
comendo sempre o mesmo alpiste
escrevo porque é através da arte que a gente resiste
Já fui tanto a um pai de santo,
a um psiquiatra, já cantei tanto mantra
Já falei com planta
já fui a um cabaré
confessei meus pecados a uma mulher
Li a bíblia, já falei com o padre, pedi oração a um pastor
e até hoje ninguém soube explicar
de onde vem a minha dor
Um dia essa dor passará
nem que seja quando eu esteja
enterrado em um cemitério
e ai será o fim do mistério
Ficará apenas a minha arte
uma nuvem, um vídeo
pois eu sou um ser do suicídio
não era pra ser
mas eu sou este ser
até a morte
me morrer
ai eu saberei
o que em vida
não dá pra se saber