
” Lá na infância,
Nada.
Por nascer em família italiana,
Rasia de sobrenome,
Mas no meio, meu avô
Desidério.
Lá na adolescência,
Nada.
Mas no meio,
Em Pernambuco,
Começando a ler,
Com certeza não foi Castro Alves, deveria.
Por ironia depois,
Por coincidência,
Machado de Assis.
Lá no meio da vida,
Veio Carol,
Num berço esplêndido,
Com desenhos de Randesmar no quarto.
E no processo,
Nada dominó,
Veio Aiara,
Veio Francisco,
Veio Vitor,
Para amar,
E entender,
O que é ser negro,
O que é ser preto.
Lá, ah! na faculdade,
Já na Bahia,
Tinha que ser a Bahia,
Veio todos os Santos,
Negros,
Pretos,
Para entender,
Ou começar a entender,
A África,
A africanidade,
Os filhos de Gandhy,
Os feitiços.
Ah! Na faculdade,
Veio Fátima,
Veio Angical,
Veio Carmelia,
Para respeitar,
O negro,
O preto,
Baiano,
Em outras vidas.
Lá no mestrado,
Veio Bell Books,
Veio Fanon,
Veio Aimé Cesaire,
Para entender a luta,
A denúncia,
A resistência,
O colonialismo,
O decolonialismo.
Ainda que sutil.
Ainda lá, no mestrado,
Veio Lucinda,
Para entender a mistura do negro,
Para entender o
Colorismo,
O “Aviso da lua que mestrua”
Sou negra, ponto final!
Ah! Lá pelo declínio da vida,
Na melhor idade,
Veio Evaristo,
Para entender que a poesia, não é só confete,
Sangra,
Ser preto escritor.
Ah! Ainda no declínio da vida,
Veio Carolina de Jesus,
Lentamente,
Para entender,
O quarto de despejo,
Onde a fome tem cor amarela.
Veio Joel Rufino,
Veio Solane Trindade,
Veio Nilma Lino,
Nas literaturas,
Para entender,
E agora mais nítido
As vozes negras,
Cruas e verdadeiras.
Ah! Ainda no declínio da vida,
Veio Marques,
Não Carl Marx,
Os búzios,
As cartas,
A ancestralidade,
A Territorialidade,
O pertencimento,
A fluidez do meu legado negro.
Ah! No meio da vida em declínio,
Veio ele,
Negro,
Preto,
Com suas dores,
Com sua cor,
Para melhor entender,
Sua voz e sua poesia.
Ah! Ainda veio hoje,
Lima Barreto para
entrar no texto.
Enfim,
Nas minhas referências negras,
Nos meus pensamentos complexos,
Nos meus falsos entendimentos,
Nas minhas fracas palavras,
Desvendadas,
Não por acaso,
Ou sim,
Por destino,
O preto que está em mim.
Márcia Rasia
Após Flib 2023.