Tecido de Afonso Franco
Ela tem olhos cor de Genebra
E de quebra
Uns seios senageleses
Mil vezes,
Mil meses
Eu dormi sobre eles
Ela é uma estátua grega
Sendo – ao mesmo tempo –
uma deusa negra do Ilê Ayê
Mar egeu, leste europeu,
África e Sertão
Gueixa do Japão
Filha do Egito
Brava escandinava
Pele do Burundi
Ela tem o Mapa Mundi
Estampado no olhar
É a mulher que eu queria
Virgem Maria, Santa Luzia
Janaína e Iemanjá
Uma boca que me faz viajar
Alemã com olhos de além- mar
Do amazonas ou de Belém do Pará
Olhos de caqui
Olhos Daqui
Da cor do Piauí
Seu olhar oriental
Me desorientou
Ela é zen budista e carnaval
Corda do destino
Violino e berimbau
Ela é Israel e Palestina
América Latina
Pai Xangô
Império Zulu
Deusa Indu
Mares do sul
No seu olhar
Seu beijo
Renova meu desejo
De navegar
Descendente de uma tribo Maia
Meus olhos ficam de tocaia
Na ponta da praia
Só para ver a beleza desta mulher
Filha de Tupã
Irmã de Jaci
Fêmea do Cariri
Companheira de Guaraci
Como é bom
Ver você aqui
Vestida de organdi
Tem o Mapa Mundi
Estampado no olhar
Ela ama Cristo e Jeová
Alá e Maomé
Mas também bota fé
Nos deuses do candomblé
Sonhei com ela
Andando nua
Em meu quintal
Estrela da bienal
Saída de dentro de um poema
De João Cabral
Senhora do meu luau
Lua no meu recital
Dona do meu martelo agalopado
Do meu repente aloprado
Inspiração da minha trova
Mãe da Bossa Nova
Inventora da Tropicália
Vencedora da Batalha
Minha poesia marginal
Corda do destino
Ela é violino e berimbau
Vive em qualquer lugar
Me ligou de Bogotá
Disse que ainda ia
Da um tempo na Turquia
Depois pousaria em Berna
Pra fazer uma tatuagem pós-moderna
Na batata da perna
E se teletransportaria
Através da voz de Gal
E daria um tempo no Nepal
E com os olhos insones, impunes
Ouviria Arnaldo Antunes
Cesária Évora
Metáfora
Mundo afora
Da Holanda até Guiné Bissau
Ela é corda do destino
Violino e Berimbau
Tomara que em noite de lua
Ela pouse nua em meu quintal
Ela Lê a Bíblia,
A Torá e o Alcorão
Mas diz que viaja
Bem além do amém
de qualquer religião
Tanto é assim
que reza pra Odin
E pra um anjo querubim
Tomara que nunca se esqueça de mim
Me contou que quem fez sua cabeça
Foi um sábio do Gabão
Um poema concreto
Tales de Mileto
Sócrates, Aristóteles e Platão,
Antonio Conselheiro
E Luís Gonzaga, rei do baião
Bob Dylan, Bob Marley
E filme de Woody Allen
A levaram muito além
Disse que sentiu
Um arrebatamento
Uma rajada de vento
Quando ouviu
Chico, Caetano e Gil
Sorrindo ela me disse
Que sua alma se subverteu
Quando leu Fernanda Young e Clarice
Bukoviski, Maicoviski e Leminski
Os olhos dela me lembram
Navios deixando o cais
Floradas Áfricas
E cafezais
Vestida de organdi
Ele tem o Mapa Mundi
Estampado no olhar
Pele do Burundi
Ela tem o Mapa Mundi
Estampado no olhar
E quando o dia azuleja
Talvez ela seja
A brisa que veleja
Sobre o mar
Pele do Burundi
Ela tem o Mapa Mundi
Estampado no olhar
Virgem Maria, Santa Luzia,
Shiva e Iemanjá
Sol da Bahia
E a poesia de navegar