“Eu ajudava meus colegas surdos na minha antiga escola, a partir daí criei gosto em ensinar matemática. Quero que os ouvintes, e especialmente, os surdos saibam que podemos ser o que queremos. E eu não quero apenas ser exemplo para os surdos, quero ajudá-los com tudo que eu aprendi.” Foi com essas palavras que Dominique Juliete Rodrigues, primeira aluna surda das licenciaturas em matemática do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA), recordou toda sua trajetória após defender seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) na tarde do último dia 29, via Google Meet, a partir da sala de reuniões do Gabinete da Diretoria Geral.
O trabalho teve como título “Contribuições de uma Licencianda em Matemática no ensino de Limites para estudantes surdos”. Dominique conta que a experiência de estudar não foi fácil e teve bastante esforço pessoal. “Mas também não foi solitária, tive o suporte de muitas pessoas especiais como meu parceiro Rafael Andrade, minha mãe Dilzia dos Anjos e minha irmã Victoria Emanuelle. O IFBA também me trouxe pessoas especiais que me inspiraram como minha intérprete Tainá Reyna e minha orientadora Anete Otília Cruz que me mostrou que posso ir mais longe e vislumbrar um mestrado, por exemplo”, relata Dominique. Ela destaca que matemática é sua matéria preferida e sempre gostou e tinha facilidade com cálculos. A banca examinadora foi composta pela professora Anete Cruz, que orientou o trabalho, além das docentes Bartira Teixeira e Daniela Cunha. A interpretação de Libras foi realizada pelos intérpretes Tainá Reyna e Ednilson Silva.
De acordo com Deivid Cassinano, coordenador da Capne (Coordenação de Atendimento às Pessoas com Necessidades Específicas), os estudantes surdos do campus são acompanhados por Tradutores Intérpretes de Libras (TILs), durante toda a vida acadêmica. “Atualmente são acompanhados 13 estudantes surdos [no total], cinco estudantes no ensino médio integrado, um estudante no subsequente e sete no ensino superior. Já concluíram 20 estudantes surdos nas diferentes modalidades”, enumera Deivid.
Uma das intérpretes que acompanhou Dominique durante o curso, Tainá Reyna também atuou durante o TCC e explicou que “fazer a tradução de assuntos ligados à área da matemática requer um trabalho em equipe. São assuntos de alta complexidade exigindo o trabalho em conjunto do professor e do profissional intérprete em sala de aula para entregar o melhor resultado para o aluno surdo. Podemos citar alguns exemplos desse trabalho em conjunto: se possível ser feita a entrega do slide ou de outro material que será utilizado em sala de aula com antecedência ao Intérprete, quando o professor estiver no quadro explicando determinado conteúdo falar pausadamente para que o intérprete faça a tradução simultânea entre outros recursos”, lembra. Tainá acredita que não existem materiais didáticos na área de matemática no mercado disponibilizado em Libras. “Inclusive, o tema de Dominique aluna da licenciatura de matemática foi abordar a importância da criação de um sinalário em matemática”, completa.
De acordo com o diretor geral do Campus Salvador, Ives Lima, esse resultado significa que a instituição está no caminho certo. “Como instituição, acreditamos e temos como missão de transformar, de fato, a vida de todas as pessoas. E, isso requer mudanças institucionais que advém de todos que fazem parte desse espaço. Notamos que ainda há um caminho longo a percorrer, mas Dominique foi determinada e, algumas/alguns de nós exerceu um papel essencial na continuidade dela no curso. Quando eu vejo Dominique à beira de receber o título como Licenciada em Matemática, vejo como toda nossa crença e luta pela educação inclusiva tem valido a pena, mesmo reconhecendo que precisamos evoluir muito e entender que a inclusão é um papel de tod@s nós. Parabenizo toda equipe da Capne. Agora inauguramos um novo horizonte, viramos referência e com certeza, teremos mais surdos(as), cegos(as), mais TEAs,…nas licenciaturas do IFBA. Que estejamos mais preparados(as) e disponíveis a aprender com eles(as)!”, afirmou o gestor.
O IFBA oferta licenciaturas em matemática nos campi Barreiras, Camaçari, Eunápolis, Salvador e Valença, além do ensino à distância.
* Henrique Soares é jornalista da Divisão de Comunicação do Campus Salvador.
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