Ao comentar as recentes revelações envolvendo seu nome em troca de mensagens por procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes teceu uma comparação: ”É o caso clássico do policial que coloca drogas no carro do investigado”, disse ao HuffPost.
Na terça (6), o site El País Brasil revelou que os procuradores da Lava Jato em Curitiba, liderados por Deltan Dallagnol, planejaram acionar investigadores na Suíça para tentar reunir munições contra Mendes. Eles passaram meses em um esforço para juntar dados e informações que embasassem um pedido de suspeição e até impeachment do ministro do Supremo.
O ministro falou em “quadro vergonhoso” ao HuffPost e completou: “Não me surpreenderei se se descobrir que eles falsificarem documentos utilizando-se do meu nome junto a instituições financeiras estrangeiras”.
No Conselho Nacional do Ministério Público, ganha força articulação para afastar Dallagnol da Lava Jato, informa o site Antagonista.
A reportagem do El País dá conta de mensagens trocadas em um grupo dos procuradores no aplicativo Telegram que foram enviadas por fonte anônima ao site The Intercept Brasil e analisadas em conjunto com a equipe do jornal espanhol.
De acordo com o site, a ideia central era rastrear um possível elo entre Gilmar Mendes e Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto, apontado como operador financeiro do PSDB, preso num desdobramento da Lava Jato. O ministro já havia concedido dois habeas corpus em favor de Preto, e a aposta dos procuradores é que ele pudesse aparecer como beneficiário de contas e cartões que o operador mantinha na Suíça — o que já estava sob investigação dos suíços.
O ímpeto de relacionar o magistrado e o operador do PSB, segundo o El País, surgiu após Deltan Dallagnol afirmar ter ouvido um boato da força-tarefa de São Paulo “de que parte do dinheiro mantido por Paulo Preto em contas no exterior pertenceria a Mendes”.
Os procuradores de São Paulo negaram as informações ao site. Já a força-tarefa de Curitiba disse que não reconhece as mensagens e, como tem afirmado desde que os diálogos começaram a ser divulgados pelo The Intercept Brasil, em 9 de junho, destacam que elas foram obtidas por meio de um crime cibernético.
Essa, porém, não foi a única vez que a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba esteve focada no ministro Gilmar Mendes. Nesta quarta-feira (7), o UOL divulgou um diálogo segundo o qual Dallagnol usou a Rede Sustentabilidade para propor uma ação no STF contra o ministro. A movimentação envolveu o senador Randolfe Rodrigues (AP), um ferrenho defensor da Lava Jato.
Para Gilmar Mendes, as trocas de mensagens reveladas até o momento indicam “que os investigadores se transformaram em integrantes de uma organização criminosa”. Ele cobra esclarecimentos “urgentes de todos os malfeitos realizados por esse grupo de celerados”.
Desde a última quinta-feira (1º), no retorno do recesso do Judiciário, as mensagens vazadas foram um dos principais assuntos na Corte. E desde já o ministro manifestou-se prontamente pelo afastamento de Dallagnol da coordenação da força-tarefa em Curitiba.
A reportagem do UOL mostra que a Rede Sustentabilidade apresentou em 11 de outubro uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo com a intenção de impedir que o ministro continuasse soltando presos em processos em que ele não estivesse à frente. Dois dias antes, Dallagnol informou a movimentação aos integrantes da força-tarefa. Isso porque Gilmar vinha de uma sequência de soltura de presos, como o ex-governador do Paraná Beto Richa, em 14 de setembro de 2018, e de outros 13 investigados.
Ocorre que a ADPF é um instrumento exclusivo de algumas instâncias, como partidos políticos com representação no Congresso, a Procuradoria-Geral da República, a Presidência da República, as mesas diretoras da Câmara e do Senado, assembleias legislativas, governadores, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e confederações sindicais de classe.
Ao articular com a Rede em nível do Supremo, Dallagnol teria usurpado sua atuação de procurador, que se restringe a causas na primeira instância da Justiça Federal, e passado por cima de Raquel Dodge.
Não é de agora que Gilmar Mendes critica a força-tarefa da Lava Jato. Em março deste ano, quando o Supremo analisava se a Justiça Eleitoral era competente para julgar crimes comuns com conexão com crimes eleitorais o ministro usou termos como “cretinos”, “desqualificada”, “despreparada”, gentalha”, “esse tipo de gente”, para se referir aos procuradores.
Ao comentar investigação de auditores da Receita Federal contra ele e sua esposa, Mendes mais uma vez criticou os procuradores, especialmente Dallagnol. “Isso não é método de instituição, é método de gângster”, afirmou na ocasião.
Em junho, logo após o início dos vazamentos, falou em tom de ironia durante uma sessão em ”último escândalo da República de Curitiba”.
Via: HuffPostBrasil